SIR HEW WHITEFORD DALlRYMPLE (1750-1830)
Informo que o texto que irão ler à continuação, foi publicado no Jornal Semana Cisterciense em 1999: há precisamente 10 anos.
Muitos estrangeiros visitaram Portugal e alguns deles deixaram belos registos do que viram. Os relatos de viagens são um género literário tão antigo e que se pode encontrar desde o tempo dos Sumérios com o poema de Gilgamesh, ou da cultura grega com os livros dos Argonautas, a Eliada e a Odisseia de Homero, os Nove Livros de Historia de Herodoto e mais recentemente no período romano com a geografia de Estrabão ou na Idade Média as Maravilhas do Mundo do italiano Marco Polo...
Nos séculos XVII, XVIII, com a secularização do ensino, sobretudo nos países protestantes, os livros de viagens surgem como um género literário muito apreciado, por registarem os costumes exóticos e pitorescos de paragens longínquas; um fenómeno informativo que nos nossos dias pode ser entendido como um princípio da era da globalização. Estes livros foram determinantes para iniciar áreas do conhecimento tão importantes como a antropologia, a sociologia, a etnografia e até mesmo a arqueologia, recordemos apenas Joachim Winckelmann. Estavam reunidas as condições para as teorias sobre a cultura e a sua história despontarem com Jacob Burckhardt.
Nos séculos XVII, XVIII, com a secularização do ensino, sobretudo nos países protestantes, os livros de viagens surgem como um género literário muito apreciado, por registarem os costumes exóticos e pitorescos de paragens longínquas; um fenómeno informativo que nos nossos dias pode ser entendido como um princípio da era da globalização. Estes livros foram determinantes para iniciar áreas do conhecimento tão importantes como a antropologia, a sociologia, a etnografia e até mesmo a arqueologia, recordemos apenas Joachim Winckelmann. Estavam reunidas as condições para as teorias sobre a cultura e a sua história despontarem com Jacob Burckhardt.
Escritos por aventureiros ricos, espiões comerciais, militares, escritores, artistas, embaixadores, políticos, negociantes... a lista é enorme. Muitos deles deixaram as suas impressões sobre Portugal, um país que achavam exótico. Alguns destes relatos são belos monumentos sobre o carácter da nossa cultura e reflectem analises desapaixonadas de quem viu um pais com um olhar distante e desapegado. Num ou noutro autor encontram-se referencias à região de Alcobaça. Pareceres documentais que nos ajudam igualmente a conhecer e a reconstruir ideias da nossa terra. Dos que temos para divulgar começamos com as impressões deixadas num diário publicado por Sir Hew Whiteford Dalrymple (1750 - 1830) , em forma de cartas que escrevia ao fim de cada jornada. Este cavalheiro era um general inglês e foi o principal negociador da Convenção de Sintra em 1808. Vejamos as suas impressões sobre Alcobaça e arredores.
“Hoje ao meio dia, o termómetro marcava dezasseis graus. Deixamos a Batalha e, depois de ter atravessado duas léguas com muitas oliveiras, encontramos à nossa esquerda alguns montes incultos, e depois trigos da Turquia e vinhas até Alcobaça; são três léguas feitas em três horas. Encontramos nessa jornada muito pouca gente e visto poucas casas e povoações. Afonso Henriques, passando por este sitio a meados do século XII, para ir sitiar Santarém, fez voto, se vencia na sua empresa, de construir neste lugar um convento de frades; por conseguinte tendo conquistado o sitio, escalando-o, empregou o espólio que havia obtido nessa guerra contra os mouros para fundar este mosteiro, que dotou ricamente. O nome de Alcobaça vem de que esta cidade está na confluência dos rios Alcoa e Baça. O convento é uma grande massa de edifícios góticos; as adições modernas que lhe têm feito desfiguram-no singularmente; a sacristia da igreja é muito rica. A comunidade está composta de cento e trinta monges bernardinos que gozam, como me disseram, de 250.000 libras de renda e vivem magnificamente. Comi com o prior, de quem recebi toda a classe de atenções; mas... ! que vergonha que estes guias celestiais possuam tantas riquezas na terra e não as utilizem noutra coisa senão para vegetar na preguiça e na ociosidade, em prejuízo da sociedade. Existe aqui uma manufactura de batistas dirigida por alguns fabricantes de Escócia e da Irlanda; mas este estabelecimento está na sua infância. Vê-se também uma torre velha, construída pelos mouros, que não tem importância nenhuma. Daqui até Lisboa o pais está fechado entre o Tejo e o mar e todo ele é guarnecido por antigos postos dos mouros.O dia 7, de Alcobaça a Caldas existem quatro léguas, que fizemos em cinco horas, através de um país quase sem cultivo” Carta nº. XIII (tradução do original António Delgado)
Talvez fruto de leituras e conversas com o abade , o general inglês conhecia alguns aspectos lendários da terra porque invoca a origem do nome de Alcobaça e sabe que Afonso Henriques prometeu construir o mosteiro se conquistasse Santarém.
Sobre este aspecto sempre me chamou a atenção o facto de Alcobaça não ter uma relação cultural forte com aquela terra além destes aspecto literário e mitológicos, já que, segundo a lenda, foi graças à conquista de Santarém que o mosteiro se construiu.
Sobre tudo o que poderia dizer a este respeito, limito-me apenas a afirmar que Alcobaça devia procurar mais aproximação com aquela terra, não só por existir um forte capital simbólico por explorar, mas também porque Santarém pretende ser reconhecida património da UNESCO. Assim que por diplomacia local, Alcobaça pode começar uma aproximação manifestando o seu apoio aquela pretensão. Os benefícios podem ser muitos, desde políticas turística , a aspectos universitários e agrícolas; cabe ao engenho local definir estratégias e tirar partido. O património histórico, artístico e outras variantes culturais das duas regiões podem ser um capital político e económico de recursos infindáveis para as duas terras. Além destes aspectos e das questões simbólicas as duas regiões estão ainda unidas por um parque natural que é outro capital turístico por explorar.
Quanto à descrição é interessante de ver como Dalrymple nos deixa uma visão da paisagem com oliveiras, vinhas e searas de trigo, transformada nos nossos dias em campos abandonados e por cultivar, só possível graças ao empenho dos sucessivos governos para institucionalizar o viver de expediente, imposto pela política de subsídios agrícolas de contornos muito duvidosos.
Ainda não há trinta anos viam-se na região muitos olivais. Reflexo disso era a quantidade de lagares de azeite existentes no concelho. O meu avó "Tjaquim D’Assenha", tinha um na freguesia de Turquel que trabalhava dia e noite de Outubro a Janeiro, como muitos outros. Quantos lagares existem hoje no concelho e inventariados numa rota turistica? Tem a câmara estudos estatísticos sobre estas matérias ou outras relacionadas com a agricultura do concelho? E a Estação Vieira Natividade? Que publicações edita ou que investigação faz a este respeito e de interesse para o esclarecimento geral dos agricultores, da história da agricultura na região e do seu desenvolvimento em geral?
Quando era criança lembro-me de existirem muitas vinhas e searas por toda a região e dos espantalhos que as assinalavam. Um marco na paisagem de uma forma de vida que o imaginário colectivo está em vias de esquecer. Os meus avós punham-me a guardar os seus trigais tocando “chanfalhos” velhos para afugentar a passarada. Um trabalho de que me orgulhava de fazer e contribuía para a minha integração na comunidade... e não me queixava de exploração infantil!
Hoje em dia é mais bonito, e um valor social assente, intoxicar a juventude com ideologias e todo o tipo de produtos para que os consumam e vivam à custa de pais com salários baixos, e nalguns casos em atraso, infectando-se deste modo a convivência familiar e social. Em vez de se sociabilizar a juventude por meios úteis ao seu bem e ao bem comum, intoxicam-na com o consumo fácil, a dependência, e o viver de expediente. Apesar de reconhecer que existe exploração infantil, não consigo ver onde começa e onde acaba, o que é discurso ideológico e de moda, ou quem parasita e manobra este tipo de questões.
Sobre este aspecto sempre me chamou a atenção o facto de Alcobaça não ter uma relação cultural forte com aquela terra além destes aspecto literário e mitológicos, já que, segundo a lenda, foi graças à conquista de Santarém que o mosteiro se construiu.
Sobre tudo o que poderia dizer a este respeito, limito-me apenas a afirmar que Alcobaça devia procurar mais aproximação com aquela terra, não só por existir um forte capital simbólico por explorar, mas também porque Santarém pretende ser reconhecida património da UNESCO. Assim que por diplomacia local, Alcobaça pode começar uma aproximação manifestando o seu apoio aquela pretensão. Os benefícios podem ser muitos, desde políticas turística , a aspectos universitários e agrícolas; cabe ao engenho local definir estratégias e tirar partido. O património histórico, artístico e outras variantes culturais das duas regiões podem ser um capital político e económico de recursos infindáveis para as duas terras. Além destes aspectos e das questões simbólicas as duas regiões estão ainda unidas por um parque natural que é outro capital turístico por explorar.
Quanto à descrição é interessante de ver como Dalrymple nos deixa uma visão da paisagem com oliveiras, vinhas e searas de trigo, transformada nos nossos dias em campos abandonados e por cultivar, só possível graças ao empenho dos sucessivos governos para institucionalizar o viver de expediente, imposto pela política de subsídios agrícolas de contornos muito duvidosos.
Ainda não há trinta anos viam-se na região muitos olivais. Reflexo disso era a quantidade de lagares de azeite existentes no concelho. O meu avó "Tjaquim D’Assenha", tinha um na freguesia de Turquel que trabalhava dia e noite de Outubro a Janeiro, como muitos outros. Quantos lagares existem hoje no concelho e inventariados numa rota turistica? Tem a câmara estudos estatísticos sobre estas matérias ou outras relacionadas com a agricultura do concelho? E a Estação Vieira Natividade? Que publicações edita ou que investigação faz a este respeito e de interesse para o esclarecimento geral dos agricultores, da história da agricultura na região e do seu desenvolvimento em geral?
Quando era criança lembro-me de existirem muitas vinhas e searas por toda a região e dos espantalhos que as assinalavam. Um marco na paisagem de uma forma de vida que o imaginário colectivo está em vias de esquecer. Os meus avós punham-me a guardar os seus trigais tocando “chanfalhos” velhos para afugentar a passarada. Um trabalho de que me orgulhava de fazer e contribuía para a minha integração na comunidade... e não me queixava de exploração infantil!
Hoje em dia é mais bonito, e um valor social assente, intoxicar a juventude com ideologias e todo o tipo de produtos para que os consumam e vivam à custa de pais com salários baixos, e nalguns casos em atraso, infectando-se deste modo a convivência familiar e social. Em vez de se sociabilizar a juventude por meios úteis ao seu bem e ao bem comum, intoxicam-na com o consumo fácil, a dependência, e o viver de expediente. Apesar de reconhecer que existe exploração infantil, não consigo ver onde começa e onde acaba, o que é discurso ideológico e de moda, ou quem parasita e manobra este tipo de questões.
2 comentários:
Olá António,
Gostei muito desta tua postagem, como sempre muito interessante. Sei que és grande leitor coleccionador desse tipo de obras que tiveram possivelmente inicio nas epopeias.
Estou neste momento a ler um livro muito interessante de Ildefonso Falcones, “La Mano de Fátima”, um romance histórico que relata a expulsão dos árabes de El Andalúz, por Isabel a Católica. O livro fala da Igreja e dos seus membros, “que não faziam nada, dedicavam-se ao vício e cobravam dos mouriscos até por irem à missa, que por outra parte era uma obrigação”. Desgraçado daquele que não ia: a “Santa Inquisição” vinha buscá-lo...
E, como em Portugal e no caso particular de Alcobaça, tudo o que tinham feito os mouros, cultivos, regadios, etc., foram abandonados e rescreveu-se uma história contaminada pela Igreja católica pela sua insigne perseguição ideológica a tudo o que era diferente.
Achei curiosa esta frase da tua postagem que leva para este livro que estou a ler: “De Alcobaça a Caldas existem quatro léguas que fizemos em cinco horas, através de um país quase sem cultivo”.
Bjs.
Olá!
Gostei do texto do general inglês e da interpretação que fazes dele.
É curioso como documentos tão antigos podem ajudar a compreender realidades actuais e até dar orientações preciosas para actuações futuras.
Bjo
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